Fundos de Pensão Estatais sob Ataque

As poupanças que garantem a aposentadoria de milhares de trabalhadores estão sendo corroídas pela quebradeira em série de bancos pequenos


Fundos de pensão de funcionários de empresas estatais podem perder pelo
menos R$ 1 bilhão com aplicações feitas em instituições fechadas pelo Banco Central


Donos da maior poupança do país, um patrimônio superior a R$ 620 bilhões, os fundos de pensão fechados de previdência complementar são motivo constante de cobiça. Mas parte importante dessa montanha de dinheiro corre o risco de virar pó, comprometendo a aposentadoria de milhares de aposentados e pensionistas, sobretudo os de empresas estatais. Atraídas por bancos pequenos e médios com a promessa de ganho fácil e rentabilidade superior à média do mercado, essas fundações têm contabilizado prejuízos recorrentes com o fechamento de uma série de instituições financeiras pelo Banco Central. Estima-se que pelo menos R$ 1 bilhão esteja comprometido com a quebra de sete bancos nos últimos dois anos: PanAmericano, Schahin, Morada, Cruzeiro do Sul, Prosper, Matone e BVA.


O que mais tem chamado a atenção dos fiscais do BC e de integrantes da Polícia Federal e do Ministério Público (MP) é o fato de serem os fundos de estatais os maiores perdedores. “A coincidência é impressionante. Em quase todos os bancos fechados por fraudes, há fundos de pensão de empresas públicas com dinheiro preso. Parece um movimento combinado, muito suspeito”, diz um técnico do BC. Os indícios de irregularidades são grandes, acreditam os policiais envolvidos nas investigações abertas a pedido do MP. Uma das suspeitas é que gestores das fundações estariam recebendo comissões “por fora” dos banquinhos para fazerem aplicações de recursos com eles. “Os agrados feitos pelos bancos de menor porte incluiriam, além de comissões, viagens, carros e festas com muitas mulheres”, ressalta um policial.


O resultado disso é uma longa briga para reaver os recursos perdidos com a intervenção e a liquidação dos bancos pelo BC. Que o diga a Fundação de Previdência dos Empregados da Companhia Energética de Brasília (Faceb). Desde 2004, a entidade tenta recuperar quase R$ 2,5 milhões aplicados em Certificados de Depósito Bancário (CDBs) do extinto Banco Santos. “Apesar de todos os exemplos de prejuízo, parte das fundações parece não ter aprendido a lição. É isso que torna as operações recentes muito suspeitas”, reforça, coberto de razão, outro fiscal do BC.


Sigilo

Somente com a recente intervenção do Banco Central no BVA, R$ 110,4 milhões aplicados por sete entidades previdenciárias ficaram ameaçados. Estão na lista, entre outras, as fundações Serpros, dos empregados do Serpro, e Infraprev, dos funcionários da Infraero. O banco alega sigilo bancário para revelar os nomes de todas as fundações, a despeito de o mercado citá-las sem nenhum constrangimento. A instituição garante ainda que, até o momento, não houve calote. Caso o banco seja liquidado e não possa honrar os compromissos, seus ex-controladores ressaltam que parte desse capital está protegida pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC).


Responsável por regular e fiscalizar os fundos de pensão, a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) garante estar fazendo a sua parte para proteger o patrimônio dos trabalhadores. “Estamos atentos aos movimentos de todas as fundações. A Previc tem todo o interesse em que essas entidades se mantenham dentro das regras e não ponham em risco o patrimônio que administram”, afirma o diretor-superintendente do órgão, José Maria Rabelo. Ele diz mais: “Não hesitaremos em denunciar, criminalmente, todos os gestores suspeitos de irregularidades. Nossa tolerância com desvios é zero”.


Rabelo garante que a grande maioria das fundações tem controles de risco e de segurança muito rígidos. “Portanto, é importante separar o joio do trigo. De qualquer forma, vamos averiguar se todos os requisitos de segurança foram seguidos à risca pelos responsáveis pela gestão dos recursos”, assinala. As aplicações, por sinal, se concentram em fundo de investimentos fiscalizados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que, procurada pelo Correio, informou “estar sempre supervisionando a indústria de fundos de investimento e o comportamento de seus participantes, inclusive em relação à diligência na aquisição de ativos, precificação e gestão de liquidez”.
A CVM destaca ainda que, no caso de uma instituição financeira sofrer intervenção ou ser liquidada pelo BC, cabe ao interventor ou ao liquidante garantir que haja a segregação entre o patrimônio dos fundos de investimentos e o do banco, de maneira que “não haja risco de ruptura do serviço prestado ao cotista”.


Investigação

Para agentes do mercado, os órgãos de fiscalização precisam ficar mais atentos e observar de perto os motivos que levam entidades previdenciárias a concentrar aplicações em bancos menores. Para alguns desses especialistas, em determinadas situações, pode haver interesses escusos. Uma Comissão de Inquérito Parlamentar (CPI) no município de Serra, no Espírito Santo, vai averiguar, por exemplo, a possibilidade de propina ou caixa dois em uma operação de R$ 40 milhões entre o fundo de previdência local e o Banco BVA. Os vereadores que fizeram as acusações, porém, ainda não apresentaram provas.


Operações milionárias sob suspeita

Autor(es): VICENTE NUNES e VICTOR MARTINS

Correio Braziliense - 28/10/2012

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