Judiciário participa de audiência pública sobre uso de inteligência artificial

O uso da inteligência artificial no Poder Judiciário, suas perspectivas e desafios, foi o tema de audiência pública promovida pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RS). Ao longo da tarde desta segunda-feira (10/10), operadores do direito atuantes em todo o sistema de Justiça estiveram reunidos para debater aspectos envolvendo o uso dessas novas ferramentas tecnológicas. Tanto os benefícios trazidos pela IA, como agilidade, celeridade e acesso à Justiça, quanto questões essenciais para o seu avanço - como transparência e ética – foram ressaltadas no encontro, realizado na OAB/RS Cubo, em Porto Alegre.

O evento foi conduzido pelo Presidente da OAB/RS, Leonardo Lamachia. “Na medida em que o desenvolvimento tecnológico e a construção de sistemas de inteligência artificial alteram, cada vez mais – e com maior intensidade –, a rotina da sociedade, se torna necessário um olhar atento em direção ao tema em todas as esferas”, afirma ele.

O Poder Judiciário estadual foi representado pelo 1º Vice-Presidente do TJRS, Desembargador Alberto Delgado Neto, que também preside o Conselho de Informática da Corte. Para o magistrado, as ferramentas de IA conferem maior racionalidade, economicidade e celeridade ao trabalho desenvolvido no Judiciário. Mas o seu uso se restringe às áreas administrativas.

O Desembargador Delgado citou iniciativas do TJRS que já utilizam as ferramentas de IA, como na distribuição de recursos no 2º grau e, no eproc-1G, o uso de robôs para localização de endereços. “Decisão judicial é uma decisão política de um agente político do Estado. A estrutura burocrática pode, sim, utilizar mecanismos de automação através de inteligência artificial”, frisou, citando ainda grupos e comissões no âmbito do TJRS que estudam e debatem o tema. “Temos diversos interesses em comum e, se trabalharmos juntos, a evolução na sociedade será muito grande. Não acreditem em teoria do caos. Acreditem em trabalho, a única coisa que faz a gente avançar”, finalizou. Também esteve presente o Juiz-Corregedor André Dal Soglio Coelho.

 

PL cria marco regulatório

O cientista de dados Álvaro Justen, o professor e coordenador do Grupo de Trabalho de Inteligência Artificial da Comissão de Direito da Tecnologia e Inovação (CDTI) da OAB/RS, Miguel Ramos, e o membro da Comissão de Juristas do Senado sobre o Projeto de Lei 21/2020, Danilo Doneda, foram convidados para abrir os debates.

Justen destacou os desafios que o tema impõe, entre eles, a observação às regras para coleta e uso de dados, em especial, as informações pessoais. Defendeu o desenvolvimento de tecnologias nacionais com modelos adequados ao Brasil e transparência de algoritmos e modelos adotados. “Tecnologia é a ferramenta para melhorar nossa vida. Mas não deve ser usada sem ser supervisionada, principalmente quanto ao uso dos dados”, ressaltou.

Já Ramos defendeu que é preciso observar com cuidado o avanço do uso de IA no Judiciário para evitar a desumanização da prestação jurisdicional e o engessamento das decisões. Para o advogado e professor, é preciso transparência nas políticas públicas e foco no jurisdicionado.

Doneda é conselheiro no Conselho Nacional de Dados e integra a Comissão de Juristas que estuda o PL que propõe o marco legal do desenvolvimento e uso da Inteligência Artificial no país. Segundo o especialista, uma regularização é necessária para evitar desequilíbrios, uma vez que a tecnologia vem causando mudanças na estrutura de poder. “São tecnologias que utilizam cada vez mais dados pessoais, de todo o tipo, a partir das quais, são capazes de mapear situações e determinar soluções rápidas e eficazes”, explicou. “A Comissão tem a missão de formular um substitutivo que possa ser um insumo para futura regulação. Atualizar regras e princípios para que a IA não mine direitos e garantias já estabelecidos”, afirmou Doneda, que também destacou a transparência e a proteção de dados como itens importantes.

 

IA como aliada

O Procurador-Geral de Justiça, Marcelo Dornelles, também participou do evento. Segundo ele, o Ministério Público Estadual vem se preocupando com a questão, desenvolvendo ferramentas que podem auxiliar no dia a dia do trabalho, mas também debatendo por meio de comissão a proteção de dados. “A IA já vem sendo utilizada, como a busca de endereços - grande parte da nossa atividade diária é essa. Já estamos criando ferramentas para dar facilidade e celeridade. Não há ato decisório, é administrativo”. O Procurador citou a CPI dos Medicamentos e Insumos Covid-19, aberta durante a pandemia para apurar possíveis irregularidades na aplicação do preço de remédios, onde foi utilizado um programa que fazia a avaliação do valor da compra das medicações, verificando se houve prática de preço abusivo. “Ninguém quer um robô, mas nas questões de assessoramento, ele será bem-vindo com cuidado, controle e transparência”.

Vice-Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, o Desembargador Ricardo Martins Costa considerou que a transparência e as regras éticas na condução dessas novas ferramentas são uma preocupação da Corte.; “Na Justiça do Trabalho, todas as formas de ferramentas tecnológicas servem para instrumentalizar atividades-meio. Jamais se pensa em um juiz robô”, afirmou. “Não temos IA atuando em nenhuma decisão. O que temos é a evolução de uma ferramenta de auxílio, e é este o caminho”.

Para a Procuradora-Geral do Município de Porto Alegre, Cristiane Nery, o momento é de grandes avanços nessa área. “Todos buscamos isso. Temos trabalhado com as corregedorias, buscando auxílio e intercâmbio de informações para trabalhar de forma conjunta”, disse ela, citando, por exemplo, as execuções fiscais, onde a automatização vem auxiliando na localização de credores. “É dinheiro público que beneficia a sociedade como um todo”.

Em sua fala, o Presidente da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (AJURIS), Desembargador Cláudio Luís Martinewski, destacou a relevância do encontro para a troca de ideias na construção de um modelo. “Eficiência, economicidade são nossa preocupação. Devemos procurar instrumentos de inovação para a efetivação da jurisdição. Assim como a humanização do sistema, que está muito mais próxima da Justiça que se quer”, afirmou o magistrado.

Fonte: Assessoria TJRS

Foto: Márcio Daudt

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